Repetindo o velho filósofo da Renânia, a história se repete,
algumas vezes como tragédia, outras como farsa. O Brasil, em sua história,
viveu essas situações. Muitas como tragédia, a última foi em 1964, com o golpe
civil-militar. Como farsa, estamos vivendo, agora, em 2016, quando enfrentamos
o golpe parlamentar, em que não se evidenciam os crimes da Presidente acusada,
embora os ritos dos julgadores se cumpram, no formalismo do uso da lei e da Constituição.
As ações humanas exigem interpretações. E essas, as interpretações, estão
eivadas de subjetivismos. Se não se sustenta a tese do crime de
responsabilidade, de que a acusam? Os argumentos se sucedem e nos vemos no meio
dessa confusão retórica em que serve a afirmação de Karl Marx, ao falar dessa
repetição sob a forma de tragédia e farsa, nos meandros da história.
A quem compete selar o destino dos humanos? Aos juízes
togados ou aos juízes eleitos pelo voto popular, como senadores e deputados? A
quem cabe julgar? Qual correção de atitudes lhes dá a legitimidade do
julgamento? O Homem de Nazaré advertia: “Quem não tem pecado, atire a primeira
pedra”. E, então? Estarão os senhores do Congresso Nacional isentos de malfeitos
e ações pouco meritórias?! As estatísticas mostram que mais da metade dos
parlamentares, seja de uma ou outra casa congressual, tem problemas com seus mandatos,
resultantes de acusações no âmbito da justiça. Qual a isenção dos senhores
julgadores? Estarão os senhores e as senhoras, que julgam, livres de qualquer
preconceito, ressentimento, desejo de vingança ou outros sentimentos vis e
comezinhos? Qual soberania de propósitos assiste os que frequentam os tribunais
e as tribunas?
Os julgadores começaram a adjetivar seus
votos, denominando-os voto moral, voto técnico, voto justo, para dimensionarem
as razões de suas decisões, escondidas atrás de biombos ideológicos,
divisionistas, em que a questão de classe fica efetivamente ocultada nas suas
falas, embora explicitada em suas atitudes. Daí a farsa.
Os senhores e senhoras, que julgam do
alto de suas competências, não se
importam em ouvir a verdadeira voz do povo, do qual eles se sentem tradutores
das ideias e dos sentimentos. A eles interessa tão somente falarem do que
entendem acerca do que ouviram das reivindicações populares, como a
insatisfação, o custo de vida, o chamado clamor das ruas, tudo para mascarar as
verdadeiras intenções e interesses dos que julgam.
A acusação de qualquer tipo de
contravenção legal requer a tipificação do crime. Pois bem, de que acusam a
Presidente? Que crime teria ela cometido? Em que ordenamento jurídico se baseou
a peça acusatória, que remete a Presidente eleita ao afastamento do poder
conquistado pela voz das urnas? O
contrato social prevê que o resultado das urnas confere ao vitorioso a
condição de gerenciamento do poder executivo, segundo as leis da República.
Isso não basta? Talvez, mas na medida em que, para haver um bom desempenho,
faz-se necessário saber articular, transigir, trocar com os membros do
Congresso, os quais em função dos seus interesses aprovam ou desaprovam os atos
da Presidência República, não sem que antes colher resultados materiais para os
seus condomínios eleitorais.
Há que serem resguardadas as definições de
ética, moral, justiça e democracia, que perdem, por vezes, seu sentido
substantivo, quando são usadas de forma solerte pelos julgadores, que pretendem
se manter na zona de conforto e fazer uso público de motivações individualistas
e partidárias, ao invés de estarem voltados para as demandas da sociedade
civil, nas suas mais diversas aparições de classes sociais e frações de classe.
Sobre tudo isso merece destaque a forma
como as conveniências aparecem no cenário político, em que sem disfarces os
arautos da “moralidade pública” interferem no jogo do poder, demonstrando uma
consciência desgastada e maculada pelos adjetivos usados nas falas, numa
flagrante atitude desrespeitosa a quem está sendo acusado, chegando à
vulgaridade.
Do que resta, cabe-nos o anúncio e a
denúncia. O anúncio de que as vozes das urnas, como as vozes das ruas, estarão
exigindo o respeito às decisões democráticas, no momento obstaculizadas pela
farsa. A denúncia se sustenta no despreparo dos poderosos aliados ao grande
capital, que não aceitaram o resultado das urnas e desde os primeiros momentos
decidiram que não permitiriam que a Presidente eleita cumprisse seu mandato até
o final.
Até mesmo o uso efetivo do dinheiro ocorreu ao pagarem os serviços da
advogada para que fosse feita uma peça acusatória. Valeu mais do que Judas, que
vendeu o Mestre por 30 dinheiros. Desta vez não houve entrega do mestre, pois
este estava junto, apenas o pagamento de 45 dinheiros àquela que aceitou
denunciar, utilizando a montagem cênica do aparato legal. Essas conveniências
dos denunciantes, acusadores e julgadores embaça a face da República, já
marcada em sua história pela tragédia e pela farsa.
Um comentário:
resta a tiririca a ultima resposta sobre os acontecimentos, pois como é comediante, a irracionalidade se tornou a mediação para interpretar os fatos.não se trata de argumentos, da constituição, do legal ou ilegal, mas de piadas sem graça. os risos e os horrores, tomaram conta do Brasil.
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