15.5.07

Controles e Racionalidades[*]

Os valores éticos desempenham um papel verdadeiramente central no sistema de valores de uma cultura, porque são eles que comandam as normas da ação e, por conseguinte, determinam, em definitivo, os modelos de comportamento, os princípios de escolha, os critérios de apreciação e as motivações a partir das quais são fixados os objetivos concretos a curto e a longo prazo. (Ladrière)

Que valores comandam a sociedade de controle? Qual sentimento de urgência se abriga nos contrafortes de uma sociedade, que necessita acelerar a inserção produtivista de seus membros, de tal sorte que as alternativas apresentadas se reduzem a tomar o trem da história da otimização de recursos e resultados, ou, permanecer na estação à espera de um novo comboio, que embarque os retardatários?!
Tais questões invadem o nosso imaginário quando pensamos em associar as razões do progresso, dos avanços tecnológicos com as razões do sujeito e seus processos interativos, nas diferentes esferas, desde a família, mundo do trabalho, espetáculos midiáticos e cenários macros de violência exterminadora.
Se, conforme Ladrière, os valores éticos possuem essa capacidade orientadora da cultura, do comportamento humano e dos objetivos sociais, tem-se a tentação de afirmar que em nosso tempo vive-se uma fragilidade ética e um fortalecimento do individualismo possessivo, na medida em que os humanos ainda não encontraram o modo de serem fraternos, de serem solidários e de serem livres. Daí decorre a necessidade de controle racional, ou seja, construimos uma sociedade, cuja possibilidade de convívio só pode acontecer via controle sobre tudo e sobre todos. Estamos num cenário de espelhos, onde olhamos e somos olhados na nossa fabricação seja do que for, instrumentos, idéias, dinheiro, lazer, enfim, chegamos a uma outra espécie de nudez, a da subjetividade. Construimos um laço social, que só pode permanecer vigoroso, se for prestado contas de tudo, pois a confiabilidade se diluiu na trama da ideologia burocrática, aliada ao frenesi da calculabilidade do progresso tecnológico, com maior eficácia e menor custo. O capital se efetivou como realidade controladora entre os humanos. Tudo deve estar ordenado no mundo dos espelhos, até mesmo a nossa satisfação. Então, produzimos espetáculos para nos mostrar satisfeitos e isso conta na quantificação de resultados.
Mas, é isso que queremos? Foi por esse ideário que desejamos tanto a autonomia da razão? É evidente que só um pensamento retrógrado seria contra a mudança, pois mudar é a caracaterística própria da espécie, no que tem de criativo e de inteligente. A questão se alinha na significação da mudança, no que ela pode produzir de melhorias sociais, de gratificações subjetivas, de alternativas éticas para o encontro das culturas, de viabilidade de caminhos, para que, ao se usufruir os resultados da ciência e da tecnologia, não ocorram privilégios que aumentem a desigualdade social e econômica. Se é preciso haver um controle, que não sejam abandonados os valores éticos, em detrimento dos valores de mercado. Que se pense, também, em valor de uso e não, apenas, em valor de troca.
Hegel observava que o homem é o privilegiado capaz de falar rompendo o circuito da natureza, ele é consciência de si. É capaz de apreender as determinações da sociedade e recolocá-las na fluência do processo. E é no processo mesmo de suas contradições que a razão apreende o real. Os desafios contemporâneos exigem que ultrapassemos a tese; não devemos nos deixar dominar pela categoria da identidade. Se pensar é pensar a contradição, nós só podemos pensar a sociedade em sua estrutura dialética, que é natureza e história. É o próprio movimento do real que produzirá a mudança, sendo este processo conduzido pela razão, razão das subjetividades. A negação se dará no seio mesmo da positividade. A sociedade que aí está não será negada por forças externas, mas ela gerará a sua contradição e poderá pensar, racionalmente, o seu controle, além dos paradigmas da eficácia e da produtividade.
Se é certo que as mudanças produzidas pela ciência e pela tecnologia produzem inovações na cultura, e, consequentemente, no mundo ético, é verdade, também, que essas mudanças podem ser trabalhadas pela razão dialética, que saberá conduzir a ação política ao encontro do projeto humano, que, em suma, é o desejo de felicidade.

[*] Texto escrito par o Jornal da ADUNISINOS.

2 comentários:

allezoom disse...

OIII
tudo bem???
Li e gostei, inda que tenha que "engulir" o senhor Hegel como lastro teórico do texto rs..pertinente e atual..o foco está realamente na "significação da mudança",daí um re-criar sentido em decisões (produção ética)que margeem a hiper atividade imperativa "espelhática" do capital é processo, não só de um caminho para a liberdade,mas também de possibilidade criativa da existência....acho euzim..cá com meus botões... abraços!!!

Unknown disse...

Ah! A ética!? Motiva indagações e espanto. Não é por acaso que Hegel anuncia que quando as sombras da noite começam a cair, levanta vôo o pássaro de Minerva. A necessidade ética se faz presente.
Onde estará o pássaro de Minerva?